sábado, 16 de maio de 2009

"Anjos e demônios" recicla os ataques à Igreja

por Marcio Antonio Campos

Na terça-feira fui ver, numa sessão para a imprensa, o novo panfleto anticatólico do diretor Ron Howard, Anjos e demônios, baseado no livro de Dan Brown. Já escrevi algumas palavras no meu blog de ciência e religião, o Tubo de Ensaio. Não vou repetir o que eu disse lá, e sim complementar.
A primeira coisa que dizem aos que atacam o filme é “você não está vendo que é ficção?”. Essa gente insinua que não sabemos diferenciar ficção de realidade. Estão enganados, nós sabemos muito bem fazer essa distinção. Tanto que sabemos inclusive distinguir quando uma ficção é empurrada como se fosse realidade. Afinal, sim, nós lemos nossa própria história… sabemos que Robert Langdon é ficção, a dra. Vetra é ficção, bomba de antimatéria é ficção. Mas a Igreja é real. Galileu é real. Bernini é real. E Dan Brown começa a enumerar uma série de fatos históricos claramente inventados, como se tivessem sido reais. Como se a Igreja tivesse reprimido a ciência por séculos, assassinado cientistas, e por aí vai.
Querem fazer um teste? Peguem o público na saída do cinema e perguntem às pessoas o que, no filme, elas consideram ser fato histórico e coisa inventada. Acreditem, muita gente vai incluir as mentiras sobre a Igreja na categoria “fato histórico”. O público vai mesmo achar que a Igreja sai marcando gente com ferro quente. Que Galileu escreveu um Diagramma veritatis. Como acharam que a Igreja tinha queimado milhões de bruxas, quando saiu O código Da Vinci. A confusão é proposital, faz parte da essência dos livros de Dan Brown. Duvidam? No site oficial do autor, há uma entrevista sobre o livro. Confiram o que ele diz a certa altura (a tradução é minha mesmo):
Sim, parte da informação factual revelada é surpreendente, mas eu acho que a maioria das pessoas compreende que uma organização tão longeva e poderosa como o Vaticano não poderia ter chegado a esse ponto sem guardar alguns esqueletos no armário. Eu acho que a razão pela qual “Anjos e demônios” está criando polêmica agora é que o livro abre alguns desses armários, que a maioria das pessoas nem sabia que existiam.
Taí a prova: Dan Brown diz que o que ele apresenta sobre a história da Igreja são fatos. Então, das duas uma: ou ele é um tremendo incompetente, que não faz pesquisa direito, para acreditar em coisas como La purga; ou é um tremendo mau-caráter, que sabe muito bem o que está fazendo.
Fora essa tentativa absurda de jogar lama na reputação da Igreja, o filme ainda tem um punhado de erros. Pelamordedeus, tivemos um conclave real em 2005! Nunca se escreveu tanto, nunca se explicou tanto na imprensa como funciona a eleição de um Papa. E conseguem fazer um zilhão de coisas erradas. Tudo bem que o livro foi escrito em 2000, mas ainda assim temos uma série de aberrações. Tem cardeal citando a Romano Pontifice Eligendo, de Paulo VI, que foi abolida em 1996 pela Universi Dominici Gregis, de João Paulo II; tem cardeal propondo eleição por aclamação, quando ela foi abolida por João Paulo II no mesmo documento; o filme coloca muito mais de 120 cardeais na Capela Sistina; inventa um cargo de “cardeal grande eleitor”, inelegível, que não existe. Será que Dan Brown não sabia que o camerlengo é necessariamente um cardeal? Que não existe restrição à eleição de não-cardeais ao papado? O pior é que dá para perceber que foi, sim, feita pesquisa. Há detalhes como as cédulas sendo costuradas depois da votação, o “extra omnes”, coisa que só quem estudou o assunto conhece. E ainda assim cometem essas barbaridades.
Mas isso é o de menos comparado à difamação da Igreja, retratada como cruel adversária da ciência, quando na verdade ela foi uma grande incentivadora da pesquisa científica. De fato, só por isso não valeria a pena gastar dinheiro com o filme. Se um ingresso cair do céu, ou se um dia passar na televisão, até seria uma oportunidade para evangelizar alguém, explicar o que está errado. Mas financiar a calúnia, aí não sei não…

Um comentário:

Kairo Rosa Neves de Oliveira disse...

O márcio nem falou neste texto da falta do amito, do cardeal segurando a hóstia "pelas beiradas", do camerlendo servindo de cerimoniário, do papa de mitra com vestes corais, além dos absurdos cientificos, como anti-matéria tão fraquinha...rs